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Retrato da profissão docente em Portugal: professores realizados, mas desmotivados para recomendar a carreira

Apesar de gostarem do que fazem e se sentirem realizados profissionalmente, muitos professores evitam recomendar a carreira docente. A conclusão é sustentada por diversos estudos e inquéritos realizados nos últimos anos, que apontam para uma crescente insatisfação com as condições de trabalho, o excesso de burocracia e a falta de reconhecimento social.

Entre os principais motivos para essa relutância estão os baixos salários, a instabilidade nas colocações, a pressão constante sobre os docentes e a escassez de recursos nas escolas. Ainda assim, a maioria dos professores afirma sentir orgulho pelo impacto positivo que tem na vida dos alunos e pela natureza transformadora da profissão.

Esse retrato contraditório é reforçado pelos dados da consulta nacional promovida pela Federação Nacional da Educação (FNE) e pela Associação para a Formação e Investigação em Educação e Trabalho (AFIET), cujos resultados foram divulgados esta quinta-feira. O inquérito, realizado entre 13 e 27 de julho, recolheu respostas de 4.638 docentes, do pré-escolar ao ensino secundário.

De acordo com os dados, 94,4% dos inquiridos dizem gostar de ser professores e 79,8% sentem-se realizados na profissão. No entanto, esse entusiasmo não se traduz numa visão positiva sobre as condições de trabalho: 90,7% consideram que trabalham em excesso para aquilo que recebem, e sentem que os salários não refletem as exigências e qualificações da função.

Mais de 70% dos docentes indicam que a profissão não é valorizada socialmente, consideram a carreira pouco atrativa e dizem sentir-se constantemente avaliados e julgados. Reflexo desse cenário é o facto de 73,2% afirmarem que não recomendariam a carreira a um jovem — ainda que esse número represente uma ligeira melhoria em relação à consulta de 2023, com menos 10,9 pontos percentuais.

Ao fazerem o balanço do último ano letivo, os docentes destacam como principais desafios o excesso de trabalho administrativo, a dificuldade em lidar com a diversidade de necessidades dos alunos, os obstáculos à conciliação entre vida profissional e pessoal e os problemas de indisciplina em sala de aula.

Mais de metade (55,7%) afirmam ter sentido falta de recursos e apoios adequados para apoiar os alunos, enquanto 44,8% referem ter dedicado mais tempo a tarefas burocráticas que consideram inúteis ou de pouca utilidade.

Questionados sobre as prioridades de investimento nas suas escolas, os docentes apontam como mais urgente o reforço do apoio a alunos com necessidades específicas (19,2%), seguido pelo aumento do pessoal de apoio educativo (18,8%) e do número de docentes (16,7%). Também foram mencionadas a melhoria dos recursos materiais e técnicos (11%) e a climatização das salas de aula (8%).

A consulta abordou ainda a questão da indisciplina: para metade dos professores, o problema agravou-se em relação ao ano anterior. As situações que mais preocupam incluem a dificuldade dos alunos em seguir regras, conversas constantes durante as aulas, não realização de trabalhos, distrações com telemóveis, violência entre colegas, faltas frequentes e agressões verbais.

Apenas um quarto dos docentes afirma não ter enfrentado dificuldades com a indisciplina. Entre os principais entraves referidos estão a falta de apoio por parte dos pais, o stress provocado pela gestão contínua de conflitos, as limitações do Estatuto do Aluno e a ausência de suporte por parte das direções escolares.