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As microsséries chinesas com episódios de 1 minuto que se tornaram uma febre no mundo

Depois de a popularidade do TikTok ter explodido, conquistando uma geração viciada em vídeos curtos, uma nova tendência chinesa com um formato igualmente radical está a espalhar-se pelo mundo.

As aplicações para telemóvel que permitem assistir a microdramas estiveram entre as aplicações de entretenimento mais descarregadas no ano passado, em inúmeros países.

Os microdramas são compostos por dezenas de episódios, com um ou dois minutos de duração. O seu conteúdo é novelesco e o ritmo é acelerado.

Títulos como A Vida Dupla do Meu Marido Milionário e Predestinada ao Meu Alfa Proibido sugerem que estas microsséries não pretendem criar uma nova forma superior de arte.

Em menos de uma hora, os espectadores podem sentir todo um espectro de emoções – e observar uma sucessão quase infinita de ganchos e suspense, como se estivessem a ver uma telenovela de 100 horas a uma velocidade acelerada.

"Adoro", escreveu um utilizador na plataforma Reddit. "Eles não perdem tempo, simplesmente começam logo a beijar-se."


Quase mil milhões de downloads
Até ao mês de março de 2025, as aplicações de microsséries foram descarregadas cerca de 950 milhões de vezes em todo o mundo, segundo a empresa de inteligência de mercado Sensor Tower.

"São acessíveis, móveis, rápidos e viciantes", afirma a economista Alicia García-Herrero, do think tank (centro de investigação e debates) Bruegel, sediado em Bruxelas, na Bélgica.

As empresas responsáveis ​​pelas aplicações de microsséries mais descarregadas estão sediadas em países como os Estados Unidos e Singapura, mas as suas raízes estão na China.

Algumas das séries são filmadas em chinês e dobradas em inglês. Mas, agora, também há séries produzidas em inglês, no Reino Unido e nos EUA.

A produtora Liu Shanshan, de Londres, criou uma empresa de filmagem de microsséries no início de 2024. Conta que já produziu 15 séries para várias plataformas.

Em média, uma série com 40 a 50 episódios demora cerca de sete a 10 dias a ser filmada, segundo a mesma. Os atores são britânicos, mas a equipa de produção reúne cidadãos britânicos e chineses.



Uma série recente é uma saga de amor com 58 episódios, intitulada O Meu Amante Real Secreto ("My Royal Secret Lover", no original em inglês).

A personagem principal é o Duque de Woodsbury, interpretado pela estrela da TV Digby Edgley. Ganhou fama num reality show britânico chamado Made in Chelsea.

Edgley percebeu que as microsséries seriam uma oportunidade para lançar a sua carreira de ator.

"Acho que é uma grande experiência para os atores", conta. "O seu ritmo é muito, muito rápido".

Na China, a produção de microsséries é ainda mais rápida. Podem ser filmados até 100 episódios por semana, segundo a publicação estatal The Paper.

A China produziu mais de 30 mil microdramas em 2024, segundo a Associação Chinesa de Serviços de Netcasting. Juntos, arrecadaram 50,4 mil milhões de yuans (7 mil milhões de dólares, cerca de R$ 39,2 mil milhões).

O valor é superior à receita total de bilheteira dos cinemas chineses, que totalizou 42,5 mil milhões de yuans (5,9 mil milhões de dólares, cerca de R$ 33 mil milhões).

A 'censura' na China

Mas esta indústria já enfrenta cada vez mais controlo.

Em fevereiro, mais de 1,2 mil microsséries foram retiradas das aplicações domésticas chinesas, incluindo o Douyin, a versão chinesa do TikTok.

As microsséries deverão servir como "um novo canal para o desenvolvimento e expansão dos valores tradicionais", segundo a Administração Nacional de Rádio e Televisão da China.

Além de proibir conteúdos "violentos e pornográficos", os dramas considerados "vulgares e de mau gosto" também deverão ser reformulados, segundo a entidade reguladora.

Os censores não definiram o que é "vulgaridade", mas indicaram que os guiões que mostram um CEO (diretor executivo de uma empresa) bilionário a apaixonar-se por uma empregada de limpeza, ou uma enteada que sofre de bullying por parte da madrasta, são desadequados.

O professor Oscar Zhou, da Universidade de Kent, no Reino Unido, afirma que os censores chineses estão a brincar à apanhada, depois da rápida explosão dos microdramas.

"Toda esta indústria é muito nova e, por isso, a censura, todo o mecanismo está a ficar para trás", explica.

Uma das séries derrubadas do Douyin em novembro passado foi O Homem Mais Rico do Mundo É o Meu Pai. Foi condenada por "promover o materialismo e exibir um estilo de vida luxuoso e extravagante".

Mas outra série com um guião semelhante ainda está disponível nos sites chineses. Chama-se Neta Divorciada de um Bilionário.

Depois do seu lançamento na China, em 2023, foi dobrada em inglês e atingiu mais de quatro milhões de visualizações no YouTube.

A série foi tão popular que a sua produtora, a empresa ShortMax, fez um remake em japonês no ano passado, como parte da sua estratégia de expansão para novos mercados.

Além do Japão, a ShortMax também adaptou o seu conteúdo a mercados como a Indonésia, Tailândia e Malásia, segundo o CEO da empresa, Liu Jinlong.

Outra companhia, a ReelShort, lançou várias séries faladas em espanhol, com atores latino-americanos. Os teasers de séries como Beija-Me pela Última Vez receberam milhões de visualizações no TikTok e no Instagram.


Os Estados Unidos são o mercado mais lucrativo, segundo a Sensor Tower. Mas o primeiro trimestre de 2025 observou perto de 100 milhões de downloads na América Latina e cerca de 87 milhões de downloads no sudeste asiático.

A empresa chinesa de dados DataEye observa que as empresas, agora, buscam o Oriente Médio e a África para dar continuidade à sua expansão.

Kum Sandy é fã das microsséries em Camarões. Ela conta que começou a assistir aos microdramas chineses em 2023, depois de encontrar anúncios de teasers nas redes sociais.

No ano passado, ela assistiu a mais de 60 séries. Os títulos incluíram NoivoCasei com Seu Pai e A Vingança da Criada.

“Fiquei obcecada, por assim dizer”, confessa Sandy.

Com colaboração de Jack Lau.







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