Nas redes sociais, é frequente ler-se que as mulheres precisam de uma a duas horas de sono a mais do que os homens. Mas será mesmo verdade? E o que mostram, afinal, os estudos científicos sobre esta diferença? Este artigo ajuda a perceber por que razão a relação das mulheres com o sono é mais complexa do que parece — e como factores biológicos, psicológicos e sociais influenciam a qualidade do descanso.
Basta uns minutos a percorrer o TikTok ou o Instagram para encontrar alegações de que as mulheres precisam de dormir muito mais do que os homens. Mas será isso real? E corresponderá ao que se verifica no dia a dia?
A resposta não é linear: quem dorme mais — e como dorme — resulta de uma combinação intricada de biologia, saúde mental e expectativas sociais. Depende ainda de como se mede o sono.
O que dizem os estudos?
Os cientistas medem o sono essencialmente de duas formas:
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Pelo autorrelato, ou seja, perguntando às pessoas quanto tempo dizem dormir — embora essa perceção seja muitas vezes imprecisa;
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Através de métodos objectivos, como monitores vestíveis ou polissonografia, que registam actividade cerebral, respiração e movimentos durante a noite.
As medições objectivas mostram que, em média, as mulheres dormem cerca de 20 minutos a mais por noite do que os homens. Um estudo global com quase 70 mil pessoas, usando monitores vestíveis, encontrou diferenças consistentes em todas as idades: por exemplo, entre os 40 e os 44 anos, as mulheres dormiam entre 23 e 29 minutos a mais.
Outro estudo, com polissonografia, revelou que as mulheres não só dormem cerca de 19 minutos a mais, como passam mais tempo em sono profundo (23% da noite, contra 14% nos homens). O mesmo estudo concluiu ainda que a qualidade do sono dos homens piora mais com a idade.
Cada caso é um caso
Apesar destas médias, a necessidade de sono varia muito de pessoa para pessoa. Sugerir que todas as mulheres precisam, por definição, de mais tempo de sono não faz sentido — tal como não faz sentido afirmar que todas são mais baixas do que todos os homens.
Além disso, embora as mulheres durmam mais tempo e com um sono teoricamente mais profundo, relatam de forma consistente pior qualidade de sono e têm cerca de 40% mais probabilidade de sofrer de insónias.
Esta contradição é bem conhecida na ciência do sono e resulta da diferença entre as condições controladas do laboratório e a vida real: muitos estudos não têm em conta factores como stress, saúde mental, flutuações hormonais ou medicação, que afectam decisivamente o descanso.
Porquê esta diferença?
As diferenças entre sexos surgem logo na adolescência e tendem a acentuar-se em fases como a gravidez, o pós-parto e a menopausa. As alterações hormonais — sobretudo de estrogénio e progesterona — influenciam directamente o sono. Muitas mulheres relatam noites piores nos dias anteriores à menstruação, quando os níveis hormonais descem.
As mulheres têm também maior risco de depressão, ansiedade e traumas — todos associados a perturbações do sono. Padrões mentais como preocupação e ruminação, mais frequentes entre mulheres, dificultam o descanso. Por fim, medicamentos como antidepressivos, mais prescritos às mulheres, interferem muitas vezes no sono.
Conclusão: mais apoio, menos mitos
Então, as mulheres precisam de dormir mais do que os homens? Em média, sim — um pouco mais. Mas, mais importante do que contar minutos na cama, é garantir que elas têm condições e apoio para recuperarem física e mentalmente ao longo do dia e da noite.
O sono não acontece no vácuo: desigualdades sociais e psicológicas pesam na balança. É fundamental olhar para o quadro geral e assegurar que todas as pessoas — mulheres incluídas — têm a oportunidade de descansar realmente.