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Vale de Judeus: Fuga ‘Planeada’ e Falha Grosseira na Segurança

Um dos cinco fugitivos da prisão de Vale de Judeus revelou que a evasão foi “planeada e executada” com muita antecedência e, de forma chocante, que “só não saiu toda a gente da cadeia porque não quis”. Esta declaração expõe uma alarmante fragilidade no sistema prisional português.

Fernando Ribeiro Ferreira, o segundo evadido a ser recapturado, dois meses depois, em Trás-os-Montes, explicou aos inspetores dos serviços prisionais que o grupo se apercebeu, de forma gradual, da crónica falta de guardas e da “inexistência” de torres de vigilância — uma realidade que, segundo ele, “era do conhecimento geral”.

De acordo com o relatório da Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais (DGRSP), a que o Expresso teve acesso, na manhã de 7 de setembro de 2024, a partir do momento em que os guardas abriram a porta de acesso aos pátios de recreio, “nunca mais houve qualquer elemento de segurança” em vigia. Os guardas estariam no gabinete “ou a tomar o pequeno-almoço, ou a fazer outra coisa qualquer”, um hábito que tanto reclusos como guardas conheciam, revelando uma cultura de laxismo inaceitável.

O documento aponta ainda que os guardas prisionais forneciam aos presos fios para estender roupa, um material que, ironicamente, acabou por auxiliar na fuga. Apesar de garantir que os cinco homens não tiveram ajuda ativa ou passiva de guardas ou funcionários, este recluso não tem dúvidas: naquele dia, a ineficácia da vigilância era tal que “só não saiu toda a gente da cadeia porque não quis”.

A 7 de setembro de 2024, evadiram-se de Vale de Judeus, em Alcoentre (Azambuja), o argentino Rodolfo Lohrmann, o britânico Mark Roscaleer, o georgiano Shergili Farjiani, e os portugueses Fábio Loureiro e Fernando Ribeiro Ferreira, todos já recapturados pelas autoridades.

A espetacular fuga de Vale de Judeus forçou Rita Alarcão Júdice a ordenar uma auditoria à segurança das cadeias portuguesas e levou ao afastamento do então diretor-geral da DGRSP, Rui Abrunhosa Gonçalves, que foi substituído interinamente por Isabel Leitão, tendo entretanto sido nomeado o novo diretor-geral, Orlando Carvalho. A auditoria confirmou as “deficiências” nos equipamentos, na organização e na gestão de recursos humanos, espelhando as denúncias do fugitivo.

A fuga deu ainda origem a um inquérito do Ministério Público para apurar eventuais responsabilidades de cariz criminal. No entanto, os processos disciplinares internos revelam uma conclusão pouco punitiva.

Arquivamentos, Suspensões e Multas: A Leveza das Sanções na Fuga de Vale de Judeus

Os nove processos disciplinares instaurados pelos serviços prisionais a sete guardas, um chefe e um diretor de Vale de Judeus após a fuga de cinco reclusos foram concluídos com dois arquivamentos, duas suspensões e cinco multas.

Segundo informações da Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais (DGRSP) à Lusa, foi decidido o arquivamento em dois casos, a suspensão de funções sem remuneração em outros dois casos e penas de multa nos restantes cinco. A DGRSP recusou especificar as sanções aplicadas a cada um dos visados, bem como detalhar a extensão e gravidade das suspensões e multas, alegando que as notificações apenas tinham sido enviadas na sexta-feira.

Os reclusos, todos já recapturados, cumpriam penas entre os sete e os 25 anos de prisão, por crimes graves como tráfico de droga, associação criminosa, roubo, sequestro e branqueamento. A leveza das sanções internas face à gravidade da fuga e às falhas estruturais expostas levanta sérias questões sobre a responsabilidade e a segurança nas prisões portuguesas.

Redação